colunista

Elias Fragoso

Economista, foi prof. da UFAL, Católica/BSB, Cesmac, Araguaia/GYN e Secret. de Finanças, Planej. Urbano/MCZ e Planej. do M. da. Agricultura/DF e, organizador do livro Rasgando a Cortina de Silêncios.

Conteúdo Opinativo

Mais uma reforma meia boca...

14/07/2024 - 06:00
Atualização: 14/07/2024 - 09:58

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E lá se vão 7 anos da aprovação da  reforma – meia boca - trabalhista (realizada no governo Temer) dita possível por que embora tenha dado um “chega prá lá” no mundo das relações trabalhistas onde só um lado tinha razão, deixou de fora questões importantes, como a extinção da (in) justiça do trabalho. Que a meu ver deveria ter suas atividades incorporadas pela justiça civil. Até hoje a sensação de incompletude domina.

Em 2019 (no governo Bolsonaro) foi a vez de mais uma reforma meia boca, desta feita, a da previdência que havia criado a expectativa de que – afinal – as disfuncionalidades do modelo seriam corrigidas e, com isso, o déficit seria contido e o desequilíbrio atuarial da previdência zerado. Mas como soi de acontecer nesse país de Macunaímas, era só brincadeirinha.

Depois dos arrumadinhos e da intervenção direta de Bolsonaro a favor dos milicos e dos funcionários federais, a “reforma foi pro brejo” e – após menos de 5 anos - já demanda nova intervenção, sob pena de, a partir de meados da década de 2030 (nesse segmento a visão é sempre de longo prazo) a dívida do setor sair do controle e “explodir” em relação ao PIB.

Isto porque, além das disfuncionalidades não resolvidas e em alguns casos, agravadas, o Brasil está se “seniorizando” rapidamente, a taxa de fecundidade vem se reduzindo a cada ano, além do país vir sofrendo um dos mais intensos processos de envelhecimento do mundo.

Somem-se a isso coisas do tipo a não equiparação das idades de aposentadorias de homem e mulher, a manutenção da diferença de idade entre urbano e rural, a não adoção de reajustes automáticos desses parâmetros segundo a expectativa de vida da população, o absurdo e a disfuncionalidade aberrante das aposentarias dos servidores federais e militares, e temos aí alguns dos “gatilhos” armados para a explosão prevista para meados da década de 2030 se nada for feito agora.

A reforma tributária, afora o notável avanço em direção a dar um fim no “manicômio tributário” reinante no país, vem trazendo em seu bojo a clara intenção de aumentar a carga tributária dos brasileiros pobres, assalariados e da classe média, uma vez que como se sabe rico neste país não paga impostos (numa relação mais ou menos de 20% de tributação para os ricos e 60% para os pobres). E essa gestão petista diz defender os pobres...

Além disso, a reforma como está sendo encaminhada prevê uma “armadilha” (para estados e municípios) até agora não desmontada, que é o tal comitê gestor inter federativo do IBS que controlará a distribuição dos recursos arrecadados pelos novos tributos federais e definirá a gestão de eventuais contenciosos.

O Comitê Gestor terá papel relevante na aplicação do princípio de destino e para a distribuição do produto da arrecadação entre os entes subnacionais − especialmente no período de transição do modelo atual (de ICMS e ISS) para o novo desenho (com o IBS não cumulativo).

Governantes do Sul e Sudeste reivindicam o controle do comitê (e estão á frente dessa batalha, o que será péssimo para o restante das regiões brasileiras). Mas, pelo andar da carruagem, o que pode ocorrer é o governo federal “na baixa” operar para “evitar a briga” entre regiões ficando ele com o controle da bolada tributária...

Tem mais problemas no bojo da “reforma”: o projeto como está estabelece que a fiscalização contábil, operacional e patrimonial do Comitê Gestor do IBS será exercida pelo Tribunal de Contas do Estado ou do Município competente para apreciar as contas do ente federativo. O Tribunal de Contas da União também poderá atuar em relação aos recursos aportados pelo governo federal para o financiamento das despesas necessárias à instalação do órgão. Portas escancaradas para eventuais negociações heterodoxas ou não republicanas...

O Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), gerido por Estados e Municípios já previsto na Emenda Constitucional (EC 132/2023) da reforma tributária, promulgada no fim do ano passado, substituirá o estadual Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) e o municipal Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS). E se somará à Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e ao Imposto Seletivo (IS), criados no novo sistema.

E como não poderia deixar de ser – por que ninguém é de ferro - os estados querem além dos benefícios auferidos no novo modelo tributário nacional acrescentarem ainda o Imposto de transmissão de Causa Mortis e doação de bens e direitos, que contempla no fato gerador a transmissão de quaisquer bens e direitos para os quais se possa atribuir valor econômico, e o Imposto sobre transmissão Inter vivos por ato oneroso, de bens móveis e imóveis e de direito a eles relativos. Enquanto as prefeituras querem uma carona para manter “por fora” da reforma a cobrança da Contribuição para o Custeio da Iluminação Pública.

Uma rota certeira para estados e municípios escorcharem ainda mais o contribuinte com aumentos abusivos na cobrança dos impostos e taxas que ficarão de fora do alcance do Comitê Gestor. Numa reforma que já se sabe terá as maiores alíquotas do mundo!  Lamentável.

Aprovado à toque de caixa na Câmara dos Deputados, o texto (PLP 68/2024) segue agora para o Senado Federal. Que já se manifesta contrário à pressa com que o tema foi tratado naquela casa legislativa. A tramitação em regime de urgência, pedida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, estabelece a cada uma das Casas do Congresso o prazo de 45 dias para a deliberação do texto, sob pena de trancamento da pauta. No entanto, em reunião dos líderes do Senado nesta quinta-feira (11), eles defenderam retirar a urgência do projeto, para que a matéria tenha mais tempo de discussão e análise naquela casa. Até o momento o Presidente do Senado ainda não anunciou a retirada da urgência...

Para completar as “reformas” meia boca ainda falta a administrativa – aquela que mexe com o funcionalismo público - que deveria atacar de frente a esculhambação que virou a gestão pública neste país. Alguém aí aposta um real furado que ela sairá?

Torce-se para que os senhores congressistas parem de olhar para o próprio umbigo dos seus interesses paroquiais e outros ainda menores. A reforma tributária precisa ser revisa pelo Senado Federal. Não é possível que se produza mais uma “reforma possível” como apontou o Presidente da Câmara Federal. Este país – e, em especial os seus cidadãos - não aguentam mais essa traições em série vinda de quem deveria defender os interesses do povo.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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